Por Michel Zaidan Filho*
( Corrupção,
impunidade e cinismo governamental)
Foi o alemão e criador da
Psicanálise, Sigmund Freud, quem cunhou a famosa expressão “O mal-estar na
Civilização” para designar uma patologia social grave que antecedeu e preparou
o advento do Nazi-fascismo e a Segunda Guerra Mundial.
Como médico, Freud diagnosticou
a presença de uma neurose coletiva, na Alemanha, produzida pelos mecanismos
civilizatórios. O trabalho, a família, a Igreja - numa sociedade luterana como
a alemã - não oferecia na época contrapartida alguma à repressão da energia
libidinal dos cidadãos e cidadãs alemãs.
O resultado, como se sabe,
foi a guerra. Os alemães, pelo menos, sempre foram introspectivos e dotados de
grandes qualidades intelectuais. Produziram gênios para o bem, e gênios para a
destruição da humanidade. A Alemanha reconstruída pelos aliados (e o dólar
americano) depois da guerra é outro país: menos filosófico e cultural e mais
econômico e pragmático.
O nosso País não foi
influenciado pelo puritanismo luterano dos alemães. Pelo contrário. O
imaginário da colonização portuguesa
apresentava a terra brasilis como um paraíso, onde não havia pecado. Ou
seja, tudo era permitido. Pelo menos até a chegada da Inquisição.
A lenda é que já nascemos
como uma sociedade de bandidos, malfeitores, criaturas sem fé e sem lei. Lugar
da aventura, não do trabalho, segundo Sérgio Buarque de Holanda. Uma sociedade
do desfrute, não da acumulação ou do sacrifício. O negócio que aqui se fez foi
à base da escravidão africana, não da ética puritana do trabalho.
Aqui, sempre se pensou mais
no fruto ou no lucro, do que no sacrifício e na renúncia para se conseguir os
frutos. Há muitas imagens consagradas pela Antropologia cultural sobre o povo
brasileiro: Macunaíma, jeca Tatu, Gerson etc.
O único herói positivo que se
tentou vender ao País foi a imagem de Airton Senna, depois de sua morte, num
momento crucial de consolidação do Plano Real. A imagem ocidentalizada de uma
pujante “sociedade civil” regeneradora dos nossos costumes não sobreviveu à
chamada “Nova República”, com os seus malandros oficiais.
O ciclo da política de
centro-esquerda e suas políticas redistributivas – com a inversão de
prioridades do gasto público – nos deu alguma esperança. Mas a herança maldita
de um velho sistema político carcomido pelo fisiologismo, o troca-troca e a
corrupção dissipou prematuramente a nossa ilusão.
Voltou a cena o que Freud
chamava de o “retorno do reprimido”. Aquilo que julgávamos morto ou
amortecido voltou com força e tende a se
espalhar como uma perigosa metátese
sobre um corpo enfermo e sem cuidados.
Como é possível, que no meio
de uma violência generalizada, um “presidente” da república citado 40 vezes nas
investigações da Operação lava-Jato tem o despudor de nomear um ministro do
Supremo Tribunal Federal, que será o revisor do relatório apresentado sobre a
mesmo operação no STF? - Como é possível que um delegado de polícia,
responsável pela matança generalizada de
pessoas em São Paulo, seja investido do cargo de Ministro da Justiça e nomeado
Ministro do STF, onde irá investigar exatamente as denúncias contra o seu superior hierárquico e nomeador?
Como foi que o ministro
Facchin adivinhou que seria sorteado relator da Operação Lava-a-Jato, se candidatando ao cargo e mudando de turma, para concorrer a ele? – Já a
nomeação, ora sob judice, de Moreira
franco –a chamada “eminência parda” do governo – para o recém-criado ministério
das parcerias obedece a uma operação cruzada cuja inteligibilidade está no
apoio que o genro de Moreira Franco dará
a Temer, reeleito Presidente da Câmara dos Deputados (Rodrigo Maia) e em
troca o sogro ganha foro privilegiado para se defender das acusações da
Operação-Lava-a-Jato. É dando que se
recebe, segundo a oração de São Francisco....
E para finalizar, a nota
tragicômica: quem tem o direito a prisão especial, na República dos ladrões?
*O garanhuense Michel Zaidan Filho é cientista político e professor da Universidade Federal de Pernambuco, na área de Ciências Humanas.
**Imagem Google: Cena do filme "Cidade de Deus".
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