Da escritora Martha Medeiros:
Tenho amigas de fé.
Uma delas, que é como uma irmã, me escreveu um email poético, dias desses. Ela
comentava, em detalhes, sobre o recital a que ela assistiu do Pianista Nelson
Freire, recentemente. Tomada pela comoção durante o espetáculo, ela finalizou o
email assim: "nessas horas Deus aparece.
Fiquei com essa frase retumbando na minha cabeça.
De fato, Deus não está em promoção, se exibindo por aí. Ele escolhe, dentro do
mais rigoroso critério, os momentos de aparecer pra gente. Não sendo visível
aos olhos, ele dá preferência à sensibilidade como via de acesso a nós. Eu não
sou uma católica praticante e ritualística - não vou à missa. Mas valorizo
essas aparições como se fosse a chegada de uma visita ilustre, que me dá
sossego à alma.
Quando Deus aparece pra você?
Pra mim, ele aparece sempre através da música, e
nem precisa ser um Nelson freire. Pode ser uma música popular, pode ser algo
que toque no rádio, mas que me chega no momento exato em que preciso estar
reconciliada comigo mesma. De forma inesperada, a música me transcende.
Deus me aprece nos livros, em parágrafos em que não
acredito que possam ter sido escritos por um ser mundano: foram escritos por um
ser mais que humano.
Deus me aparece - muito! - quando estou em frente
ao mar. Tivemos um papo longo, cerca de um mês atrás, quando havia somente as
ondas entre mim e ele. a gente se estende em meio ao azul, que seria a cor de
Deus, se ele tivesse uma.
Deus me aparece - e não considere isso uma heresia
- na hora do sexo, desde que feito com quem ama. É completamente diferente do
sexo casual, do sexo como válvula de escape. Diferente, preste atenção. Não
quer dizer que qualquer sexo não seja bom.
Neste exato instante em que escrevo, estou
escutando "My Sweet Lord" cantada não pelo George Harrison (que Deus
o tenha), mas por Billy Preston (que Deus o tenha, também) e posso assegurar: a
letra e um animado bate-papo com Ele, ritmado pelo rock´n´roll. Aleluia.
Deus aparece quando choro. Quando a fragilidade é
tanta que parece que não vou conseguir me reerguer.
Quando uma amiga me liga de um país distante
a demonstra estar mais perto do que o vizinho do andar de cima. Deus aparece no
sorriso do meu sobrinho e no abraço espontâneo das minhas filhas. E nas
preocupações da minha mãe, que mãe é sempre um atestado da presença desse cara.
E quando eu o chamo de cara e ele não se aborrece,
aí tenho certeza de que ele está mesmo comigo.
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