AS INQUIETAÇÕES DO PRÍNCIPE E IMPERADOR

O Imperador, também chamado pelos Áulicos de Príncipe, provocou a Audiência na Sala de Justiça, na cidade sede da Província.

Como tudo que faz sua Excelência, a atitude majestosa foi imediatamente notícia nos neo rádios, virtuais emissoras de TV e jornais à antiga. As teletelas também se encarregaram de espalhar a informação por todas as unidades da Província.

O Imperador não esperava reação do reles professor, nem tampouco que acontecessem manifestações de solidariedade ao transgressor.

Mas aconteceram e irritaram profundamente o Príncipe.

Irresponsavelmente alguns intelectuais e blogs sujos querem transformar o reles professor em vítima e contestar o gesto correto e justo de sua majestade. Deviam lembrar da máxima de que “O Príncipe é infalível”.

Daí que Vossa Majestade não se preocupou em comparecer a Audiência marcada na Sala de Justiça, encarregando dois dos melhores rábulas da Província – pagos a peso de ouro – para representá-lo.

Ora, o Imperador não ia se nivelar a um pobre professor. Um sonhador sem dinheiro e sem prestígio na Alta Sociedade. Tinha que se preservar e deixar a humilhação para o rebelde, o insubmisso.

Não se pode dar trela aos frustrados que não se banqueteiam nas mesas do poder.

Imagine a petulância do reles professor: insinuar através de artigos publicados em jornais e blogs que o Príncipe obteve vantagens através do superfaturamento nas obras de construção da Arena da Província.

Imperdoáveis essas ilações.

O imperador não foi, tem mais o que fazer. 

É melhor deixar o professor falando sozinho para que isso não se transforme numa bola de neve.

Pela cabeça do Príncipe ainda passou, por um momento, que seus Áulicos o aconselharam mal nessa questão. O reles professor pode estar parecendo maior do que Sua Excelência, nessa discussão.

Já teve até quem tenha dito que o Imperador deu um tiro no pé.

O Príncipe ficou inquieto, por instantes e desabafou até com a esposa, no sagrado recanto do Lar.

Está temeroso de que o caso vá prejudicar o Partido dos Justos nas próximas eleições.

Não teve um outro Príncipe, aqui mesmo na Capital da Província, que foi preterido pelo populacho, simplesmente porque deu uma banana para baderneiros?

O povo é volúvel, ignaro, passional. Às vezes faz suas escolhas motivado apenas pela emoção, sem pensar direito no que o futuro lhe reserva.

“É melhor deixar pra lá essas coisas menores”, pensou o Imperador, consciente de que tinha de se preocupar com outras questões.

A Rainha não gostava dele, não o perdoava pelo seu posicionamento no passado. Ela estava muito desgastada, é verdade, mas ainda tem a chave do cofre.

A seca continua, a segurança pública está um caos, a educação engatinha, a saúde anda bagunçada... Todas essas questões importantes tirando o sono do Príncipe e seu Guru não estava mais presente para orientá-lo como agir.

Melhor esquecer as insinuações de superfaturamento nas obras da Arena, os artigos do professor, a audiência na Justiça. Deixar as coisas seguirem seu curso...

O imperador está convencido de que o pau sempre quebra para o lado do mais fraco, Ele tem dinheiro, poder e muitos aliados. Vai esperar pacientemente passar o turbilhão para colocar o reles professor no seu devido lugar. 

(O texto é uma obra de ficção. Qualquer semelhança com a realidade é apenas uma pequena coincidência -  Roberto Almeida).

*Imagem: Ilustração de "O Príncipe", de Maquiavel.

Este post foi publicado também no Blog de Magno Martins, a quem agradecemos por reproduzir o texto.